sábado, 29 de outubro de 2011

A IMPRENSA E O PODER LOCAL

Artigo de opinião publicado na última edição do jornal O FUNDAMENTAL, na altura em que celebra o seu 18º aniversário.

Não é certamente fácil assegurar a missão de informar ou a de opinar sobre uma qualquer realidade local estando o sucesso do projecto jornalístico muito dependente da apreciação e da valoração subjectiva que uns e outros, entre eles, agentes políticos e económicos, façam do tratamento que a redacção deste - e a dos outros órgãos de comunicação social - dá ao conjunto de temas e de conteúdos que decidem publicar.
Mas esta crónica está longe de pretender abordar esta temática sob a óptica do “mensageiro”, até porque no caso do jornal FUNDAMENTAL ele atingiu agora a “maioridade”!... 18 anos, parabéns.

Reforma da administração local
Não há pois tempo para festejos, está aí a chegar a Reforma da Administração Local que exige toda a nossa disponibilidade para responsavelmente a apreciarmos.
Sem querer fazer súmulas que poderiam pecar por imprecisão realço, no entanto, alguns aspectos que me chamaram a atenção:
·      Considero positivo a elaboração do Documento Verde de Reforma da Administração Local pois coloca este tema na agenda do País, baliza o seu debate e dá tempo bastante para que ele se faça.
·      O Documento reconhece, o que nem sempre a administração central faz, que o Poder Local potenciou a melhoria na qualidade de vida da população e que as autarquias são um “veículo de descentralização de políticas que visam o desenvolvimento económico e social das populações”.
·      Este Documento refere ainda que “vivemos um tempo em que o modelo de gestão deve ser analisado e estruturalmente melhorado, permitindo-se de tal forma o reforço saudável do Municipalismo”.

O que é a Reforma
A proposta em discussão tem por base uma reforma de gestão, uma reforma de território e a reforma política do poder local. Elegeu como eixos de intervenção: o sector empresarial local, a organização do território, a gestão municipal, intermunicipal e o financiamento e também a democracia local. E é este último eixo que nos causa maior apreensão, mas já lá vamos!
Aguarda-se a elaboração do Livro Branco do Sector Empresarial Local que explicitará as condições em que será admissível criar novas entidades e como serão aglomeradas as existentes, pois pretende-se uma redução significativa do seu número. Enquanto isso foi suspensa a criação de novas empresas locais e admite-se, desde já, a extinção das que apresentem prejuízos nos últimos 3 anos ou das que têm receitas que dependem em mais de 50% de subsídios dos Municípios. Avisa-se ainda de que serão estabelecidos limites restritivos ao endividamento deste sector empresarial e de que será feita uma análise aos vencimentos dos seus Conselhos de Administração. Nada tenho a obstar a estas ideias base, creio mesmo que, se isso fosse juridicamente possível, a maior parte das empresas locais criadas por um único município deveriam ser extintas, regressando à esfera da autarquia as suas atribuições.
Vão estar em discussão, no âmbito da organização do território, os critérios que determinarão a redução do número de freguesias, actualmente 4.259, por via da sua agregação. Este estudo teve em linha de conta – e isto é muito positivo – que aqueles critérios variam consoante a maior ou menor densidade populacional e se as freguesias são de tipologia rural ou urbana. Com esta opção, o concelho de Salvaterra de Magos, que tem 90 habitantes/Km2, mantém as suas 6 freguesias, porque nos concelhos de nível 3 - aqueles cuja densidade fica aquém dos 100 hab/Km2 - é possível manter uma freguesia na sede do concelho, as freguesias medianamente urbanas têm de ter mais de 1.000 habitantes e, no caso geral, as rurais devem ultrapassar os 500.
No que diz respeito à gestão municipal, intermunicipal e financiamento talvez o mais emblemático, por enquanto, seja a redução do número de técnicos dirigentes municipais. No caso do concelho de Salvaterra de Magos teríamos de passar dos actuais cinco chefes de divisão municipal (de obras, de urbanismo, da área administrativa, da área financeira e da área cultural) para três. Quando tivermos mais dados sobre a alteração ao paradigma do financiamento das autarquias - exigindo-se uma maior dependência do orçamento municipal de receitas próprias – as preocupações podem avolumar-se pois julgo que serão gerados importantes constrangimentos aos municípios do interior e àqueles, como Salvaterra de Magos, onde o desenvolvimento da economia local foi sendo preterido em nome de outras prioridades definidas pelas sucessivas gestões autárquicas.
Deixei para o fim o eixo da reforma que se reporta à democracia local. Actualmente há 308 presidentes de câmara, 836 vereadores a tempo inteiro e 67 a ½ tempo, num total de 1.170 vereadores. As Assembleias Municipais incorporam um total de 11.205 membros. Estes são alguns dos números que se pretendem reduzir. Por exemplo as Câmaras Municipais que tenham entre 10.000 e 50.000 eleitores passarão dos actuais 6 vereadores + Presidente, para 4 vereadores + Presidente, limitando-se ainda a 2 o número desses vereadores que podem estar a tempo inteiro. De um modo geral haverá um corte de 1/3 no número de autarcas (Câmaras e Assembleias Municipais) o que se me afigura razoável. Deixará também, segundo esta proposta, de haver eleições para a Câmara Municipal, mantém-se as eleições para as Assembleias de Freguesia e Municipais. O cidadão que encabeçar a lista mais votada será, respectivamente, Presidente da Junta de Freguesia (como hoje já sucede) e Presidente da Câmara Municipal. Neste Documento é ainda dito que serão reforçadas as competências das Assembleias Municipais e que caberá ao Presidente de Câmara escolher o seu elenco de entre os cidadãos eleitos para a Assembleia Municipal, preenchendo – se quiser – a totalidade dos lugares na vereação com correligionários seus, ou seja, defende-se a existência de executivos homogéneos (monocromáticos). Não podia estar mais em desacordo com este princípio. Aceito como bom que a maioria dos lugares no órgão Câmara Municipal possa ser entregue à lista vencedora das eleições, independentemente de o ter conseguido (ou não) com maioria (Presidente + 2 vereadores, no caso de Salvaterra de Magos), mas os demais lugares disponíveis (2, na mesma Câmara Municipal) devem ser distribuídos em função dos resultados pelos partidos da oposição. Com esta sugestão consegue-se assegurar a governabilidade da autarquia - quem ganha tem a maioria e pode aplicar o seu Programa Eleitoral - sem empobrecer a qualidade da democracia representativa. Os custos a pagar seriam exactamente os mesmos, os autarcas na Câmara Municipal é que deixariam de ser todos do mesmo partido.

Imaginem caros (e)leitores que o debate político e a informação que dele resulta chega apenas de 2 em 2 meses quando reúne a Assembleia Municipal e compare-o com o que hoje sucede!
Imaginem caros jornalistas que para o vosso trabalho apenas teriam a informação veiculada por uma Câmara Municipal de partido único e o debate “distante” de uma Assembleia Municipal ocasional!
Talvez não valha a pena correr o risco de reformarmos a democracia local ao ponto de lhe induzirmos défice democrático!

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